terça-feira

[AF 447]

[o verso do Chico Buarque representa a pura verdade, a dor da gente não sai no jornal. Para os jornalistas, de certa forma habituados ao sofrimento humano, não existe nada pior do que ter de escrever sobre uma tragédia coletiva. Não duvidem que, no momento em que está escrevendo seu texto, pressionado pelo horário de fechamento, ele preferiria não estar ali. É uma sensação de derrota. Ali a dor dos familiares das vítimas também é sua. Acidentes como esse da Air France trazem a morte para mais perto de sua cadeira. Esse convívio com a morte é quase permanente e, por força dessa circunstância, teríamos que ter o coração mais frio. Mas não conseguimos. Nunca participei de coberturas como essa do voo da Air France, mas já vi colegas em situação semelhante tentando manter o equilíbrio num momento tão difícil. E como nessa hora a cobertura cresce em número de páginas, jornalistas de todas as áreas são convocados. Gente que escreve sobre economia, que escreve sobre música, que escreve sobre futebol acaba telefonando para familiares, para especialistas, autoridades. Não há como o jornalista fugir da morte, ela é a companheira mais incômoda em nossa viagem. E ela sempre nos testa, mede nossos nervos, aperta o coração e faz tudo para desistirmos. E nós continuamos, cada dia mais fracos.]

6 comentários:

  1. Coisa horrivel esta...
    Sumir no ar.
    Outro dia li em algum lugar que ao nascermos, junto nasce o medo em nós e este nos acompanha por toda a vida.
    Hoje pensava nas famailias que não terão como enterrar seus mortos.

    ResponderExcluir
  2. O melhor disso é não embrutecer-mos. Prefiro a fraqueza à insensibidade.

    ResponderExcluir
  3. Desculpem, errata, embrutecermos. Emburreci-me

    ResponderExcluir
  4. A vida nos cobra dívidas pesadas.... Como dizia a música que a Elis cantava, "viver só lhe custa a vida"...

    ResponderExcluir
  5. Obrigada por nos dar um outro olhar da profissão.
    Às vezes, confundimos certas posturas com insensibilidade, tipo deformação profissional.
    Bom saber que não é bem assim.
    "E nós continuamos, cada dia mais fracos." - será mesmo? ou será que este modo de confronto (com tudo, sob pressão de "fecho") não os tornará mais humanos?
    um abraço de Lisboa

    ResponderExcluir
  6. Lilia,
    Eu vivi a maior parte da minha vida dentro de redações de jornais e revistas. Hoje não trabalho numa redação e sinto falta do clima que reinava nesses locais. Passei mais tempo no trabalho do que com minha família. E é sempre na dor que conhecemos as pessoas.

    Claro que existem jornalistas sensacionalistas, mas esses nem considero colegas, porque eles enlameiam o nome de nossa profissão.

    Acho que continuamos mais fracos e mais humanos. Mais fracos porque percebemos como não conseguimos interferir, por mais que queiramos. A morte sempre nos traz um sentimento de derrota. Mesmo assim, a vida segue...
    Beijos

    ResponderExcluir

Dê seu pitaco